sábado, 2 de março de 2013

RACISMO - Preconceito velado, mas devastador

03/02/2013 -- 00h00

RACISMO - Preconceito velado, mas devastador

Mapa da Violência e estatísticas sobre acesso à universidade comprovam desigualdade entre brancos e negros no Brasil - país, aparentemente, sem conflitos raciais
Ricardo Chicarelli
O sociólogo Renato Munhoz defende mudanças profundas na sociedade: "Quando se reconhece a necessidade de políticas públicas, se reconhece também que há racismo"
A repercussão sobre o tratamento ofensivo dispensado a um menino negro de 7 anos que acompanhava os pais adotivos em uma concessionária de carros importados no Rio de Janeiro, há algumas semanas, jogou luz sobre uma discussão que permeia a história do Brasil: afinal, somos um país racista?

Apesar de não haver preconceito assumido, o relato dos negros brasileiros que denunciam olhares tortos, desconfiança, apelidos maldosos e tratamento ''diferenciado'' em lojas, consultórios, bancos ou supermercados não deixa dúvidas de que são discriminados em função do tom da pele. Estatísticas como as divulgadas pelo Mapa da Violência 2012, que detectou 75% de negros entre os jovens vitimados por homicídios no Brasil em 2010, totalizando 34.983 mortes, chamam a atenção em um país que aparentemente não enfrenta conflitos raciais.

A disparidade entre o nível de escolaridade é outro indicador importante. De acordo com o Censo 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), entre os brasileiros com nível superior completo há 9,8 milhões de brancos e 3,3 milhões de pardos e pretos. Já entre a população sem instrução ou que não terminou o ensino fundamental os números se invertem: são 40 milhões de pretos e pardos e 26,3 milhões de brancos.

''O racismo no Brasil é subjetivo, mas as consequências dele são bem objetivas'', afirma o sociólogo Renato Munhoz, educador da Colmeia, uma organização que busca despertar o protagonismo em entidades sociais, incluindo instituições ligadas à promoção da igualdade racial.

Ele enfatiza que os negros, vitimizados pela discriminação em função da cor da pele, são minoria nas universidades, na política, em cargos de gerência e outras esferas relacionadas ao poder. ''Quando chegam a essas posições, causam 'euforia''', analisa, referindo-se, na história contemporânea, ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa e ao presidente dos EUA, Barack Obama.

Munhoz acrescenta que o racismo tem raiz histórica. ''Remete ao sequestro de um povo de sua terra para trabalhar no Brasil. Quando foram supostamente libertados, acabaram nas periferias e favelas das cidades, impedidos de frequentar outros locais'', afirma.

Esse contexto, para ele, tem sido perpetuado através dos tempos, apesar da existência da lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989, que define como crime passível de reclusão os preconceitos de raça ou de cor. ''A não aceitação de negros em alguns espaços é evidente'', reforça. A subjetividade do racismo também se expressa no baixo volume de denúncias nas delegacias. No Paraná, de acordo com dados do Boletim de Ocorrência Unificado da Polícia Civil, de 2007 a 2012 foram registrados 520 crimes de preconceito, o que resulta em uma média de apenas 86 registros por ano.

Por todas essas evidências, Munhoz defende a transformação da questão racial em políticas públicas, a exemplo das cotas para negros nas universidades. ''Quando se reconhece a necessidade de políticas públicas, se reconhece também que há racismo'', diz. Ele acrescenta, ainda, que os desafios dessas políticas passam pela melhoria no atendimento em saúde à população negra e no combate à intolerância religiosa. ''Não reconhecer as religiões de matriz africana é outro indicador de racismo.''

Crime e injúria

O delegado titular da Delegacia de Furtos e Roubos de Curitiba, Amarildo José Antunes, interpreta como reais os números registrados pela Polícia Civil. Ele esclarece que o maior número de casos registrados configura-se injúria qualificada, e não crime de preconceito. ''A lei é bem específica quanto aos casos que configuram crime, como impedir que uma pessoa entre em determinado estabelecimento comercial ou negar emprego a alguém por causa de sua cor. Já xingar alguém ou fazer referência à sua cor em um momento de discussão configura-se injúria, que é bem mais comum. Os procedimentos são diferentes, assim como as penas, mas as pessoas ainda confundem muito'', informa Antunes. Em caso de flagrante, o crime de preconceito pode resultar em prisão. Já na injúria qualificada é registrado termo circunstanciado e as partes são convocadas para audiência posteriormente. (Colaborou Silvana Leão)

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Carolina Avansini
Reportagem Local

fonte: http://www.folhaweb.com.br/?id_folha=2-1--278-20130203

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